O
teste é simples: tente ir ao supermercado e não se espantar com o valor dos
alimentos. A cesta básica, segundo os especialistas, é um dos principais
indicadores do atual momento econômico do país. “Para levar as mesmas coisas
que está acostumado a comprar, o brasileiro gasta hoje 15% a mais no supermercado”,
garante o economista Gilberto Braga.
De acordo com o Dieese, Departamento Intersindical de
Estatística e Estudos Socioeconômicos, a cesta básica de alimentos registrou,
no último mês, alta em 14 das 18 capitais brasileiras. A cesta mais cara entre
as capitais foi a de São Paulo, com preço médio de R$ 378,86, seguido pela de
Florianópolis (R$ 359,76) e a do Rio de Janeiro (R$ 357,27)
Moradores de Olaria, bairro da zona norte do Rio de Janeiro, os
vendedores autônomos Luis Carlos Capozi e Margarida Pereira sabem muito bem o
quanto a inflação mudou os hábitos de consumo dos brasileiros. “Tudo está mais
caro: supermercado, água, luz, faculdade etc”, afirma Margarida. Na lista dos
gastos da família tem ainda o aluguel e o combustível do carro. “E o pior é que
nossa renda, muitas vezes, não acompanha esses aumentos”.
Diante dos desafios financeiros, o casal, que sustenta a família
de sete pessoas, apega-se à providência divina. “A fé e o amor a Deus nos fazem
superar quaisquer problemas e dificuldades. Não nos resta outro caminho senão
rezar ao Pai para que cuide da nossa família em todos os momentos”, confessa a
vendedora.
E a esperança deve ser mesmo a maior virtude dos cristãos em
momentos de crise, afirma o Bispo Auxiliar da Arquidiocese do Rio de Janeiro,
Dom Pedro Cunha. “O olhar do cristão sobre as realidades terrenas nunca pode
ser pessimista, mas cheio de esperança e ânimo. Atravessamos um momento difícil
e de incerteza econômica, mas temos de sublinhar a participação ativa de todo o
laicato no exercício de sua cidadania e com espírito democrático”.
O teólogo da PUC Rio, Paulo Fernando Carneiro de Andrade,
recorda que a Igreja não deve ficar alheia aos problemas econômicos que afetam
a população. “Existe claramente um compromisso da Igreja com a justiça. Nós
temos, no momento, uma crise que aumenta a má distribuição de renda e o
sofrimento maior das camadas mais pobres da população”.
Doutrina
Social da Igreja
Para entender melhor a atual crise econômica, os cristãos podem
recorrer aos documentos da Igreja, como orienta Dom Pedro Cunha, um dos
responsáveis pelo curso de Doutrina Social da Igreja na Arquidiocese do Rio.
“Não faltam documentos socais da Igreja que se ocupam deste tema com muita
atenção, sobretudo no nível sócio-econômico e político; são inspiradores para
uma análise da crise econômica atual”.
A Doutrina Social da Igreja deve ser o guia dos cristãos para
assuntos sociais, já que aborda temas como o desenvolvimento, a família, o
trabalho, a economia e a política. “Documentos que falam não somente de uma
responsabilidade econômica de quem está no governo de uma nação, como também da
prática constante da Justiça, que deveria ser o reduto intacto do exercício do
Direito”, afirma Dom Pedro.
Em 2009, durante encontro com o Clero de Roma, o Papa Bento XVI
citou os documentos ao analisar a então crise econômica da Europa. Para o Santo
Padre, hoje Papa Emérito, o egoísmo e a avareza humana estão na raiz do
problema.
Dom Pedro Cunha lembra que o tema também já foi abordado por
outros pontífices. “O Papa Francisco fala que a dignidade de cada pessoa humana
e o bem comum deveriam estruturar toda política econômica, de modo que esta
nunca será eficaz sem perspectivas nem programas de verdadeiro desenvolvimento
integral (E.G., 203). Portanto, toda economia deve se voltar e valorizar as
várias dimensões do homem, isto é, o homem integral na sua totalidade”.
Futuro
Assim como é para muitos brasileiros, a casa própria é o sonho
da família Pereira, mas o aluguel, por enquanto, é a maior realidade. Os gastos
básicos, cada vez maiores, impedem que a família economize. “Se estivéssemos em
situação mais confortável, com menos contas para pagar, talvez já tivéssemos
alcançado esse objetivo”, lamenta Margarida.
Na projeção dos especialistas, este deve ser um ano de cautela.
“Nós nos comportamos como aquela pessoa que saiu de férias e estava gastando o
dinheiro do salário, a gratificação de férias e o 13º. De repente, as férias
acabaram, vimos que o dinheiro acabou e precisamos fazer mudanças nos hábitos
de vida”, garante o economista Gilberto Braga, que acredita que a economia só
deve melhorar em 2016. “Vamos passar por um longo período de ajustes”.
O papel dos cristãos, neste momento, é ser canal de esperança
para todos os brasileiros. “Devemos buscar, na luz do Evangelho e no sal da
Igreja, construir elementos em conjunto com toda a sociedade. Neste momento de
crise, torna-se mais urgente esse processo de reflexão, que busca ações que
construa o mundo mais fraterno, igual e solidário”, salienta o teólogo Paulo
Carneiro.
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